quinta-feira, 30 de abril de 2009

O SILÊNCIO MÍSTICO



O vento soprou nas paredes da pele, um quarto da alma reluziu no vazio.
Animas viajantes beiraram a janela com seus cantares estremecidos.
Arrepios percorreram o fio dos dois mundos, tocaram o frio do inverno e o colo do máximo amor.
Assim surgiram cântaros flamejantes na visão mística de uma poesia virginal!

Atreveu-se um olhar tímido no fadário de seus momentos etéreos.
Sabido dos completos 23 versos em 365 sopros de inspiração interina e vivaz, mergulhou.
Mergulhou em suas memórias untadas de céu e de terra, nas energias voláteis e telúricas!
Dirigiu-se ao poço das doçuras, como um verdadeiro teurgo, e bebeu da água em fogo colhida do universo!

Agora, cheio do vinho místico e à procura das taças, visionava brindes solenes, alegres, sorridentes.
Cantava à procura de embriagados em felicidade nos seios de seus silêncios e na mente de suas audições.
Sentia como um irmão do vulcão prestes à erupção, imóvel, humilde, intenso e imponderável!
Caminhava, sereno, pasmem, nas relvas às proximidades do próprio Criador.

Sua câmara secreta era a beleza do sagrado lótus interno.
As águas quentes do rio subiam as montanhas num fluxo mágico.
Sua língua tocava o céu com um fogo líquido, dourado.
As luzes no topo eram os sinais deixados pelos rishis.

Sentia a candura dos astros, via o braço das galáxias, escutava o mantra “OM”.
Acompanhara o nascer da mãe, o sorrir do filho, e as energias de compaixão.
Reuniu-se com a Morte e apresentou os presentes de Vida, e seguiu, seguiu, seguiu de mãos dadas com a Eternidade.
Compreendeu as ligações de todos os fatos reencarnados, reservado, calou-se na multidão.

Inconteste, subiu a montanha da vida diária e desceu aos abismos de seu próprio céu.
Misturou-se na face de sua amada todo o colorido de suas descobertas.
Juntou-se à chama das alegrias, aconselhou os espíritos, e fez poesias.
Não plantou apenas uma árvore visionária, jorrou sementes frutíferas no invisível com sua própria senda.

Meditou, meditou, meditou na vida, na sabedoria, em Brahman...
Sentiu o desvanecer dos Himalayas e mergulhou em turiyananda.
Neste estado, esqueceu-se dos corpos e de todo o Veda.
Reuniu todas as existências, tornou-se Mahadeva, voltou a Ser!

Escutou nos recantos do silêncio místico, nos vales de si mesmo, grandioso clamor:
Sou o silêncio das palavras, e o sopro vivente de todo coração!
Sou além de toda a procura, se não me procuras, me encontrou!
Sou além de qualquer máscara, superior a todas falácias!

Sou o Ser e o Não-Ser, sem contradição!
Sou a vida escondida, o Eterno Mistério Sou!
Sou a Causa, o Meio e o Todo, Mahavida, Sat-Chit-Ananda Sou!
Sou a Fonte das Doçuras, Sou a Consciência-Amor-Om!


- Samuel S. Silva -


Notas do sânscrito:

Rishis (do sânscrito): Sábios, mestres espirituais, mentores da sabedoria contida nos Upanishads (a parte final dos Vedas, contendo a essência espiritual da sabedoria antiga).

Mantra (do sânscrito): Palavra oriunda de “Manas”: Mente – e “Tra”: Controle. Literalmente, significa “Controle da mente”.
Determinadas palavras evocam uma atmosfera superior que facilita a concentração da mente e a entrada em estados alterados de consciência. Os mantras são palavras dotadas de particular vibração espiritual, pois são palavras sintonizadas com padrões vibracionais elevados. São análogos às palavras-senhas iniciáticas que ligam os iniciados aos planos superiores.
Pode-se dizer que os mantras são as palavras de poder evocativas de energias superiores. Como as palavras são apenas a exteriorização dos pensamentos revestidos de ondas sonoras, pode-se dizer, também, que os mantras são expressões da própria mente sintonizada em outros planos de manifestação.

OM (do sânscrito): A vibração do TODO que está em tudo, o verbo divino, o som da criação, o mantra de Brahman, O Supremo.

Brahman (do sânscrito): O Todo, O Absoluto, O Supremo, O Grande Arquiteto Do Universo, O Amor Maior Que Gera a Vida.

Turiyananda (do sânscrito): Turiya é uma expressão baseada nos Upanishads. Significa "o quarto estado". Dentro dos ensinamentos dos antigos rishis da Índia há três estados de consciência ordinários: Vigília, sonho e sono sem sonhos.
Quando alguém transcende esses três estados conscienciais pelas vias da meditação ou de um estado alterado da consciência, diz-se que ela entrou em estado de Turiya, ou melhor dizendo, "o quarto estado". Por isso alguns mestres diziam aos seus discípulos: "Medite e vá para o quarto!" Pois é, esse quarto não era um espaço físico para onde ir, mas sim um estado de transcendência simbolizado também pelo próprio mantra Om.
Para maiores detalhes nesse aspecto, recomendo ao leitor ver o capítulo "Mandukya" dos Upanishads. A essa altura do campeonato, nada melhor do que reproduzir um trecho explicativo do próprio livro (na tradução feita para o inglês por Swami Prabhavananda e Frederick Manchester):
“A vida do homem é dividida entre os estado de vigília, o sonho e o sono sem sonhos. Porém, transcendendo esses três estados, encontra-se a visão superconsciente, denominada simplesmente "O Quarto". Os Upanishads – Sopro Vital do Eterno" – Ed. Pensamento.
Ananda (do sânscrito): Bem-Aventurança; Êxtase Espiritual.

Vedas (do sânscrito): Escrituras sagradas mais antigas e importantes da Índia.

Mahadeva (do sânscrito): Maha: Grande, Vasto, Imenso – Deva: Divindade, Ser Celestial. Logo, Mahadeva significa "Grande Divindade", "Grande Ser Celestial", "Grande Deus".

Sat-Chit-Ananda (do sânscrito): "Sat": "Ser"; "Chit": "Consciência"; "Ananda": "Bem-Aventurança". É um mantra muito utilizado pelos iogues. Significa que o atman (essência divina, espírito) está consciente e tem a nítida percepção cósmica de que está completamente permeado pela onipresença de Brahman (O Absoluto, O Todo, Deus) no centro do coração espiritual.

(Texto publicado no Boletim Informativo “Paz e Luz” nº 09; páginas 16-17.)

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